terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A visita da Verdade

A visita da Verdade
Certa feita, disse o Mestre que só a Verdade fará livre o homem; e, talvez
porque lhe não pudesse apreender, de imediato, a vastíssima extensão da
afirmativa, perguntou-lhe Pedro, no culto doméstico:
— Senhor, que é a Verdade?
Jesus fixou no rosto enigmática expressão e respondeu:
— A Verdade total é a Luz Divina total; entretanto, o homem ainda está longe de
suportar-lhe a sublime fulguração.
Reparando, porém, que o pescador continuava faminto de esclarecimentos
novos, o Amigo Celeste meditou alguns minutos e falou:
— Numa caverna escura, onde a claridade nunca surgira, demorava-se certo
devoto, implorando o socorro divino. Declarava-se o mais infeliz dos homens, não
obstante, em sua cegueira, sentir-se o melhor de todos. Reclamava contra o
ambiente fétido em que se achava, O ar empestado sufocava-o — dizia ele em
gritos comoventes. Pedia uma porta libertadora que o conduzisse ao convívio do dia
claro. Afirmava-se robusto, apto, aproveitável. Por que motivo era conservado ali,
naquele insulamento doloroso? Chorava e bradava, não ocultando aflições e
exigências. Que razões o obrigavam a viver naquela atmosfera insuportável?
Notando Nosso Pai que aquele filho formulava súplicas incessantes, entre a
revolta e a amargura, profundamente compadecido enviou-lhe a Fé.
A sublime virtude exortou-o a confiar no futuro e a persistir na oração.
O infeliz consolou-se, de algum modo, mas, a breve tempo, voltou a lamuriar.
Queria fugir ao monturo e, como se lhe aumentassem as lágrimas, o Todo-
Poderoso mandou-lhe a Esperança.
A emissária afagou-lhe a fronte suarenta e falou-lhe da eternidade da vida,
buscando secar-lhe o pranto desesperado. Para isso, rogou-lhe calma, resignação,
fortaleza.
O pobre pareceu melhorar, mas, decorridas algumas horas, retomou a
lamentação.
Não podia respirar — clamava, em desalento.
Condoí do, determinou o Senhor que a Caridade o procurasse.
A nova mensageira acariciou-o e alimentou-o, endereçando-Lhe palavras de
carinho, qual se lhe fora abnegada mãe.
Todavia, porque o mísero prosseguisse gritando, revoltado, o Pai Compassivo
enviou-lhe a Verdade.
Quando a portadora de esclarecimento se fêz sentir na forma de uma grande
luz, o infortunado, então, viu-se tal qual era e apavorou-se. Seu corpo era um
conjunto monstruoso de chagas pustulentas da cabeça aos pés e, agora, percebia,
espantado, que ele mesmo era o autor da atmosfera intolerável em que vivia, O
pobre tremeu cambaleante, e, notando que a Verdade serena lhe abria a porta da
Libertação, horrorizou-se de si mesmo; sem coragem de cogitar da própria cura,
longe de encarar a visitadora, frente a frente, para aprender a limpar-se e a purificarse,
fugiu, espavorido, em busca de outra furna onde conseguisse esconder a própria
miséria que só então reconhecia.
O Mestre fêz longa pausa e terminou:
— Assim ocorre com a maioria dos homens, perante a realidade. Sentem-se
com direito à recepção de todas as bênçãos do Eterno e gritam fortemente,
implorando a ajuda celestial. Enquanto amparados pela Fé, pela Esperança ou pela
Caridade, consolam-se e desconsolam-se, crêem e descrêem, timidos, irritadiços e
hesitantes; todavia, quando a Verdade brilha diante deles, revelando-lhes a
condição em que se encontram, costumam fugir, apressados, em busca de
esconderijos tenebrosos, dentro dos quais possam Cultivar a ilusão

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