terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O culto cristão no lar

Povoara-se o firmamento de estrelas, dentro da noite prateada de luar, quando
o Senhor, instalado provisoriamente em casa de Pedro, tomou os Sagrados Escritos
e, como se quisesse imprimir novo rumo à conversação que se fizera improdutiva e
menos edificante, falou com bondade:
— Simão, que faz o pescador quando se dirige para o mercado com os frutos
de cada dia?
O apóstolo pensou alguns momentos e respondeu, hesitante:
—Mestre, naturalmente, escolhemos os peixes melhores. Ninguém compra os
resíduos da pesca.
Jesus sorriu e perguntou, de novo:
—E o oleiro? que faz para atender à tarefa a que se propõe?
- Certamente, Senhor — redarguiu o pescador, intrigado —, modela o barro,
imprimindo-lhe a forma que deseja.
O Amigo Celeste, de olhar compassivo e fulgurante, insistiu:
—E como procede o carpinteiro para alcançar o trabalho que pretende?
O interlocutor, muito simples, informou sem vacilar:
—Lavrará a madeira, usará a enxó e o serrote, o martelo e o formão. De outro
modo, não aperfeiçoará a peça bruta.
Calou-se Jesus, por alguns instantes, e aduziu:
—Assim, também, é o lar diante do mundo. O berço doméstico é a primeira
escola e o primeiro templo da alma. A casa do homem é a legítima exportadora de
caracteres para a vida comum. Se o negociante seleciona a mercadoria, se o
marceneiro não consegue fazer um barco sem afeiçoar a madeira aos seus
propósitos, como esperar uma comunidade segura e tranquila sem que o lar se
aperfeiçoe? A paz do mundo começa sob as telhas a que nos acolhemos. Se não
aprendemos a viver em paz, entre quatro paredes, como aguardar a harmonia das
nações? Se nos não habituamos a amar o irmão mais próximo, associado à nossa
luta de cada dia, como respeitar o Eterno Pai que nos parece distante?
Jesus relanceou o olhar pela sala modesta, fêz pequeno intervalo e continuou:
—Pedro, acendamos aqui, em torno de quantos nos procuram a assistência
fraterna, uma claridade nova. A mesa de tua casa é o lar de teu pão. Nela, recebes
do Senhor o alimento para cada dia. Por que não instalar, ao redor dela, a
sementeira da felicidade e da paz na conversação e no pensamento? O Pai, que
nos dá o trigo para o celeiro, através do solo, envia-nos a luz através do Céu. Se a
claridade é a expansão dos raios que a constituem, a fartura começa no grão. Em
razão disso, o Evangelho não foi iniciado sobre a multidão, mas, sim, no singelo
domicilio dos pastores e dos animais.
Simão Pedro fitou no Mestre os olhos humildes e lúcidos e, como não
encontrasse palavras adequadas para explicar-se, murmurou, timido:
—Mestre, seja feito como desejas.
Então Jesus, convidando os familiares do apóstolo à palestra edificante e à
meditação elevada, desenrolou os escritos da sabedoria e abriu, na Terra, o primeiro
culto cristão do lar.

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