terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Os descobridores do homem

Finda a leitura de alguns trechos da história de Job, a palestra na residência de
Simão versou acerca da fidelidade da alma ao Pai Todo-Bondoso.
Diante da vibração de alegria em todos os semblantes, Jesus contou, bemhumorado:
— Apareceu na velha cidade de Nínive um homem tão profundamente consagrado a Deus que todos os seus contemporâneos, por isso, lhe rendiam especial louvor. Tão rasgados eram os elogios à sua conduta que as informações subiram ao Trono do Eterno. E, porque vários Arcanjos pedissem ao Todo-Poderoso a transferência dele para o Céu, determinou a Divina Sabedoria fôsse procurado, na selva da carne, a fim de verificar-se, com exatidão, se estava efetivamente
preparado para a sublime investidura.
Para isso, os Anjos Educadores, a serviço do Altíssimo, enviaram à Terra quatro rudes descobridores de homens santificados — e a Necessidade, o Dinheiro, o
Poder e a Cólera desceram, cada qual a seu tempo, para efetuarem as provas indispensáveis.
A Necessidade que, em casos desses, sempre surge em primeiro lugar,aproximou-se do grande crente e se fêz sentir, de vários modos, dando-lhe privações, obstáculos, doenças e abandono de entes amados; entretanto, o devoto,robusto na confiança, compreendeu na mensageira uma operária celeste e venceua,revelando-se cada vez mais firme nas virtudes de que se tornara modelo.
Chegou, então, a vez do Dinheiro. Acercou-se do homem e conferiu-lhe mesa lauta, recursos imensos e considerações sociais de toda sorte; mas o previdente
aprendiz lembrou-se da caridade e, afastando-se das insinuações dos prazeres fáceis, distribuiu moedas e posses em multiplicadas obras do bem, conquistando o
equilíbrio financeiro e a veneração geral.
Vitorioso na segunda prova, veio o Poder, que o investiu de larga e brilhante autoridade. O devoto, contudo, recordou que a vida, com todas as honrarias e dons,
é simples empréstimo da Providência Celestial e usou o Poder com brandura,educando quantos o rodeavam, por intermédio da instrução e do trabalho bem orientados, recebendo, em troca, a obediência e a admiração do povo entre o qual nascera.
Triunfante e feliz, o crente foi visitado, enfim, pela Cólera. De maneira a sondar-lhe a posição espiritual, a instrutora invisível valeu-se dum servo fraco e ignorante e tocou-lhe o amor próprio, falando, com manifesta desconsideração, em assunto privado que, embora expressão da verdade, constituía certo desrespeito a qualquer pessoa de sua estatura social e indiscutível dignidade.
O devoto não resistiu. Intensa onda sanguínea lhe surgiu no rosto congesto e ele se desfez em palavras contundentes, ferindo familiares e servidores e
prejudicando as próprias obras. Sômente depois de muitos dias, conseguiu restaurar a tranquilidade, quando, porém, a Cólera já lhe havia desnudado o íntimo,
revelando-lhe o imperativo de maior aperfeiçoamento e notificando ao Senhor que aquele filho, matriculado na escola de iluminação, ainda requeria muito tempo, na
experiência purificadora, para situar-se nas vibrações gloriosas da vida superior.
Curiosidade geral transparecia do semblante de todos os presentes, que não ousaram trazer à baila qualquer nova ponderação. Estampando no rosto sereno sorriso, o Cristo terminou:
— Quando o homem recebe todas as informações de que necessita para elevar-se ao Céu, determina o Pai Amoroso seja ele procurado pelas potências educadoras. A maioria dos crentes perdem a boa posição, que aparentemente desfrutavam,nos exercícios da Necessidade que lhes examina a resistência moral;
muitos voltam estragados das sugestões do Dinheiro que lhes observa o desprendimento dos objetivos inferiores e a capacidade de agir na sementeira do bem; alguns caem, desastradamente, pelas insinuações do Poder que lhes
experimenta a competência para educar e salvar os companheiros da jornada humana, e raríssimos são aqueles que vencem a visita inesperada da Cólera, que
vem ao círculo do homem anotar-lhe a diminuição do amor próprio, sem a qual o espírito não reflete o brilho e a grandeza do Criador, nos campos da vida eterna.
O Mestre calou-se, sorriu compassivamente, de novo, e, porque ninguém retomasse a palavra, a reunião da noite foi encerrada.

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