terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A receita da felicidade

Tadeu, que era dos comentaristas mais inflamados, no culto da Boa Nova, em
casa de Pedro, entusiasmara-se na reunião, relacionando os imperativos da
felicidade humana e clamando contra os dominadores de Roma e contra os rabinos
do Sinédrio.
Tocado de indisfarçável revolta, dissertou largamente sobre a discórdia e o
sofrimento reinantes no povo, situando-lhes a causa nas deficiências políticas da
época, e, depois que expendeu várias considerações preciosas, em torno do
assunto, Jesus perguntou-lhe:
—Tadeu, como interpreta você a felicidade?
—Senhor, a felicidade é a paz de todos.
O Cristo estampou significativa expressão fisionômica e ponderou:
—Sim, Tadeu, isto não desconheço; entretanto, estimaria saber como se
sentiria você realmente feliz.
O discípulo, com algum acanhamento, enunciou:
—Mestre, suponho que atingiria a suprema tranquilidade se pudesse alcançar a
compreensão dos outros.
Desejo, para esse fim, que o próximo me não despreze as intenções nobres e
puras.
Sei que erro, muitas vezes, porque sou humano; entretanto, ficaria contente se
aqueles que convivem comigo me reconhecessem o sincero propósito de acertar.
Respiraria abençoado júbilo se pudesse confiar em meus semelhantes, deles
recebendo a justa consideração de que me sinta credor, em face da elevação de
meu ideal.
Suspiro pelo respeito de todos, para que eu possa trabalhar sem impedimentos.
Regozijar-me-ia se a maledicência me esquecesse.
Vivo na expectativa da cordialidade alheia e julgo que o mundo seria um paraíso
se as pessoas da estrada comum se tratassem de acordo com o meu anseio
honesto de ser acatado pelos demais.
A indiferença e a calúnia doem-me no coração.
Creio que o sarcasmo e a suspeita foram organizados pelos Espíritos das
trevas, para tormento das criaturas.
A impiedade é um fel quando dirigida contra mim, a maldade é um fantasma de
dor quando se põe ao meu encontro.
Em razão de tudo isso, sentir-me-ia venturoso se os meus parentes, afeiçoados
e conterrâneos me buscassem, não pelo que aparento ser nas imperfeições do
corpo, mas pelo conteúdo de boa-vontade que presumo conservar em minhalma.
Acima de tudo. Senhor, estaria sumamente satisfeito se quantos peregrinam
comigo me concedessem direito de experimentar livremente o meu gênero de
felicidade pessoal, desde que me sinta aprovado pelo código do bem, no campo de
minha consciência, sem ironias e críticas descabidas.
Resumindo, Mestre, eu queria ser compreendido, respeitado e estimado por
todos, embora não seja, ainda, o modelo de perfeição que o Céu espera de mim,
com o abençoado concurso da dor e do tempo.
Calou-se o apóstolo e esboçou-se, na sala singela, incontido movimento de
curiosidade ante a opinião que o Cristo adotaria.

Alguns dos companheiros esperavam que o Amigo Celeste usasse o verbo
em comprida dissertação, mas o Mestre fixou os olhos muito límpidos no discípulo e
falou com franqueza e doçura:
— Tadeu, se você procura, então, a alegria e a felicidade do mundo inteiro,
proceda para com os outros, como deseja que os outros procedam para com você.
E caminhando cada homem nessa mesma norma, muito breve estenderemos na
Terra as glórias do Paraíso.

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