terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O servo inconstante

Á frente de todos os presentes, o Mestre narrou com simplicidade:
— Certo homem encontrou a luz da Revelação Divina e desejou ardentemente
habilitar-se para viver entre os Anjos do Céu.
Tanto suplicou essa bênção ao Pai que, através da inspiração, o Senhor o
enviou ao aprimoramento necessário com vistas ao fim a que se propunha.
Por intermédio de vários amigos, orientados pelo Poder Divino, o candidato,
que demonstrava acentuada tendência pela escultura, foi conduzido a colaborar
com antigo mestre, em mármore valioso. No entanto, a breve tempo, demitiu-se,
alegando a impossibilidade de submeter-se a um homem ríspido e intratável;
transferiu-se, desse modo, para uma oficina consagrada à confecção de utilidades
de madeira, sob as diretrizes de velho escultor. Abandonou-o também, sem
delongas, asseverando que lhe não era possível suportá-lo. Em seguida, empregouse
sob as determinações de conhecido operário especializado em construção de
colunas em estilo grego. Não tardou, entretanto, a deixá-lo, declarando não lhe
tolerar as exigências. Logo após, entregou-se ao trabalho, sob as ordens de
experimentado escultor de ornamentações em arcos festivos, mas. finda uma
semana, fugiu aos compromissos assumidos, afirmando haver encontrado um chefe
por demais violento e irritadiço. Depois, colocou-se sob a orientação de um
fabricante de arcas preciosas, de quem se afastou, em poucos dias, a pretexto de
se tratar de criatura desalmada e cruel.
E, assim, de tarefa em tarefa, de oficina em oficina, o aspirante ao Céu dizia,
invariávelmente, que lhe não era possível incorporar as próprias energias à
experiência terrestre, por encontrar, em toda parte, o erro, a maldade e a
perseguição nos que o dirigiam, até que a morte veio buscá-lo à presença dos Anjos
do Senhor.
Com surpresa, porém, não os encontrou tão sorridentes quanto aguardava. Um
deles avançou, triste, e indagou:
— Amigo, por que não te preparaste ante os imperativos do Céu?
O interpelado que identificava a própria inferioridade, nas sombras em que se
envolvia, clamou em pranto que só havia encontrado exigência e dureza nos
condutores da luta humana.
O Mensageiro, no entanto, observou, com amargura:
—O Pai chamou-te a servir em teu próprio proveito e, não, a julgar. Cada
homem dará conta de si mesmo a Deus. Ninguém escapará à Justiça Divina que se
pronuncia no momento preciso. Como pudeste esquecer tão simples verdade,
dentro da vida? O malho bate a bigorna, o ferreiro conduz o malho, o comerciante
examina a obra do ferreiro, o povo dá opinião sobre o negociante, e o Senhor, no
Conjunto, analisa e julga a todos. Se fugiste a pequenos serviços do mundo, sob a
alegação de que os outros eram incapazes e indignos da direção, como poderás
entender o ministério celestial?
E o trabalhador inconstante passou às consequências de sua queda impensada.
Jesus fêz uma pausa e concluiu:
—Quem estiver sob o domínio de pessoas enérgicas e endurecidas na
disciplina, excelentes resultados conseguirá recolher se souber e puder aproveitarlhes
a aspereza, inspirando-se na madeira bruta ao contacto da plaina benfeitora.
10
Abençoada seja a mão que educa e corrige, mas bem-aventurado seja aquele
que se deixa aperfeiçoar ao seu toque de renovação e aprimoramento, porque os
mestres do mundo sempre reclamam a lição de outros mestres, mas a obra do bem,
quando realizada para todos, permanece eternamente.

Nenhum comentário: